29 abril, 2012

O Último Gesto

Algum dia não a verá como antes
E seu sorriso será triste e distante

Lembrarás dos momentos passados
E será dor toda a alegria abrasada

Não contentará o teu choro íntimo
E derramará o teu pranto desatado

Porém, com dignidade de quem sofre
Dará o nó a corda com toda serenidade

Então, no gesto último de sua escolha
Olharás para vida e não verá mais nada.

Fabiano Silmes

18 abril, 2012

Voltando a pensar.


É, eu tenho visto e conversado com gente diferente, talvez isso tenha me feito perceber que não há regra nesse jogo de azar que se chama viver.
Não existe certo, nem errado. Há apenas uma certeza de que o certo a se fazer é a mera vontade que se tem. E poder fazer é o verdadeiro milagre divino da vida.
Por isso eu prefiro seguir andando por aí, falando o que eu ainda posso dizer em voz alta para os que ainda tem o dom de ouvir.
O melhor é que não é preciso ter nexo, nem fluxo. É apenas um impulso psicológico de uma mente deturpada e cansada. Ou seja. Um desabafo.

16 abril, 2012

Cidades


 I

Houve um tempo em que me dediquei aos vinis
Pouquíssimo tempo
Essencialmente pós-moderno
Abraço o caos como o Paladino à ordem
Busco no núcleo de todo turbilhão de coisas
A coisa em si, o núcleo duro do Real,
A pulsão de vida, A Vontade primeira.

No caos urbano da cidade me perco e me acho
Andando por seus becos, aliso seu corpo
Na intimidade de dois amantes
Cheiro os seus perfumes e fedores
Em boates no entre-lugar do luxo à sarjeta
Entre o sagrado das catedrais e o profano das ruas
Com seus loucos, mendigos e prostitutas.

Neste mar de cheiros e sensações encontro
o menu que escolherei:
O glamour da zona-sul 
com pitadas da marginalidade que a cerca.
Como um igual proscrito, ando em meio à horda
Dividindo o barril de cerveja holandesa
com o menino de rua.

Pegando cigarros emprestados
Dividindo bocas beijadas
Meu corpo se dissolve aos poucos,
se reintegrando ao cosmos.
Para cair mais uma vez,
com asas (nunca dantes tidas) queimadas

Sabor de cinzas, O odor, A desordem
Me alinho e saio em zigue-zague.
Por outros caminhos.
Sempre por outros caminhos.
Imerso nos sons revoltos da noite,
entre sirenes e buzinas impacientes

Como mais um anjo caído:
Caio, salvo na porta de um bar.

II

Vozes conversadas de manhã
Em bares, padarias
Catete.

Por bancas de jornal, jornais
Contando o cotidiano, simulacro do dia anterior:
“- E os bueiros explodindo?”
É dessa porra que eu gosto!
Caótica e hostil!
Entendo e me compadeço do seu
Medo e Receio.

Senhoras à igreja com crianças ainda sonolentas
levadas pelo braço.
Até o largo do machado.
Desapareço.

III

Pela ponte toda, eu durmo.
Sigo reto, sem sentir 
que troquei de ônibus no moinho.
Sem ver, cheirar ou sentir.

Cheiro Alcântara.
Gritaria de ambulantes,
entre o consumismo apressado de uma manhã,
que antecede ao almoço sacro, Pré-Fausto;
que não é de Goethe.

E como um protagonista de Romero,
sigo trôpego pelas ruas.
Nesta estranha paz,
que permeia as manhãs de domingo
no meu bairro
e o cheiro de flores,
canto de pássaros.

Nada lembra os odores da noite passada:
os perfumes misturados
com bebidas e cigarro na minha rota roupa,
paralelamente, são as únicas lembranças.

IV

E o porto seguro (quando as pernas não mais aguentam): cama.
Que a promessa de ressaca
Arrependimento não traz
E se o fizesse:
o mandaria as favas!
Ou pra puta que o pariu, mesmo.

Provavelmente, não assistirei ao Silva
Comerei o sacro almoço frio e
com as bênçãos de Hipnos, Morpheu, Ícelo e Fântaso
hibernarei com as lembranças:
As minhas amantes,
As cidades.