A cidade fede a feijão azedo,
E sua capa pegajosa de gordura
Adere aos meus sapatos gastos
Como um apelido cruel de infância,
Ou o olhar insosso dos idosos.
Ao longe soam os tambores dos vencidos,
Ecoando pelas esquinas escurecidas,
Tingidas de sangue e excrementos.
Ao lado me berram palavras da bíblia,
Enquanto velamos a nossa vergonha nua.
A criança que se deita sobre o fidalgo,
O velho que distribui impropérios na praça,
O jovem que chafurda em umbigo próprio:
Esta é a cidade de meus pesadelos,
Esta é a terra natal de minha angústia e choro.
Lua que só no céu brilha e não ilumina,
Esconde as rugas da decepção e dor.
Ônibus catados de pingentes de bijuteria,
Kombis que levam transeuntes como hortifruti,
Semáforos sempre vermelhos para a alegria.
Levo a cidade para casa, em minhas roupas velhas,
E minhas idéias sujas, em meu coração roto,
Minha insistência tatuada na pele seca.
Reflexos de mediocridade soberba, Manchester,
O dormitório onde repousam todas as esperanças.
Ao deitar, escovo de meus ombros, como caspa,
As desventuras de mais um dia na cidade.
Limpo os sapatos das ruas sem asfalto,
E dedilho a lira legada de um padroeiro sacana,
Que convertia as putas da esquina da Matriz.
Encravada entre o céu e a montanha,
Banhada por praias que não iluminam mais,
Amo-te e te odeio, cidade que eu sou,
Porque sou para sempre, somos todos,
E todos vocês são... Gonçalo.
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